1952, HELSINQUE



Nina Romaschkola, recordista russa, foi ouro no lançamento de disco em 1952 - Acervo CDI




Duração: de 19 de julho a 3 de agosto
Países: 69
Atletas: 4.995

A organização desta Olimpíada preencheu uma lacuna histórica, mais uma vez devido ao conturbado momento político. A capital finlandesa se prepara para receber os Jogos 12 anos antes, em substituição a Tóquio, mas se viu em combates com a União Soviética, que a impediram de sediar a competição. Já com a Segunda Guerra Mundial encerrada, Helsinque se tornou a menor cidade a abrigar uma edição olímpica de verão. À época, eram apenas 367 mil habitantes, não muito menos do que os 571 mil atuais.

A edição marcou a entrada de uma potência olímpica nos Jogos: a União Soviética. Pela primeira vez reunindo as nações socialistas, o bloco terminaria a competição em segundo lugar, com 71 medalhas, apenas cinco a menos que os Estados Unidos. Os americanos, no entanto, levaram ampla vantagem em medalhas de ouro: 40 a 22. Também estrearam China, Israel e Sarre, estado federado da Alemanha que, após a guerra, passou a ser administrado pela França. Em sua única participação, os 36 representantes da região saíram da única Olimpíada que disputaram sem conquistar medalhas.

A abertura aconteceria no Estádio Olímpico de Helsinque, construído em 1938 para os Jogos que, originalmente, estavam programados para dois anos depois. Foi lá que a estudante Barbara Rotraut-Pleyer, uma pacifista alemã, saudou os espectadores, mas, impedida, não conseguiu encerrar seu ato pela unificação de seu país, então dividido entre Oriental e Ocidental. Naquele ano, a Alemanha ainda competia como uma só nação, embora não tivesse nenhum representante da parte comunista oriental.

Com capacidade para 70 mil torcedores, o estádio abrigou também a cerimônia de encerramento, além de três modalidades: futebol, atletismo e hipismo. Lá, o tchecoslovaco Emil Zatopek escreveu seu nome na história dos Jogos. A Locomotiva de Praga venceu os 5.000 m e conseguiu ouros e recordes olímpicos nos 10.000 m e na maratona, prova em que fazia sua estreia. Para completar a festa, sua mulher, Dana Zátopková, foi campeã no lançamento de dardo.

Os Jogos marcaram a consagração da seleção húngara do artilheiro Ferenc Puskás, que formava o trio ofensivo com Nándor Hidegkuti e Sándor Kocsis. O time goleou a Turquia nas quartas de final por 7 a 1, impôs 6 a 0 sobre e Suécia e, na final, bateu a Iugoslávia por 2 a 0. No Brasil, a geração ficou marcada pela expressão “a Hungria de Armando Nogueira", uma brincadeira de Nelson Rodrigues com o jornalista esportivo. O time de Puskás só seria derrotado dois anos depois, pela Alemanha Ocidental, na final da Copa do Mundo.

A delegação brasileira viajou para a Finlândia com 108 atletas de15 modalidades. Foram dois bronzes, com José Telles da Conceição, no salto em altura, e com o nadador Tetsuo Okamoto, nos 1.500m. Em Helsinque, o país voltou a ganhar um ouro depois de 32 anos, com Adhemar Ferreira da Silva, que, na prova, bateu quatro vezes o recorde mundial do salto triplo.

CURIOSIDADES

Primeiro ouro       

Nina Romashkova foi a primeira medalhista olímpica da história da União Soviética. Nascida em Ecaterimburgo, hoje parte do território russo, ela conquistou o ouro no lançamento de disco com o recorde mundial de 51,42 m.

Pioneira Estrella Puentes foi a 1ª mulher a carregar a bandeira do Uruguai nos Jogos.

Delegação de um homem só

Helsinque marcou a primeira participação da China nos Jogos, mas, com o convite feito ao país em cima da hora, os times de futebol e basquete chegaram tarde demais para as suas disputas. O nadador Wu Chuanyu foi o único representante do país a competir.


MEU AVÔ BICAMPEÃO OLÍMPICO         


Diego e o avô, Adhemar Ferreira da Silva - Arquivo pessoal




As mãos dadas ao avô conduziam o pequeno Diego Menasse para mais um dia de escola em São Paulo. Nos dias em que tinha a companhia, ele se acostumou a ouvir efusivos agradecimentos ao patriarca da família. Muito novo, não conseguiu entender a importância das duas medalhas de ouro que tinha em casa. Eram de seu avô Adhemar Ferreira da Silva, único brasileiro no Hall da Fama da Federação Internacional de Atletismo.

— Para mim, era normal ser bicampeão olímpico. Todo mundo falava com ele, que adorava, mas eu não tinha consciência — revela o jornalista e humorista Diego Menasse, único neto de Adhemar, hoje com 32 anos. — Um pouco depois de sua morte (em 2001), eu comecei a fazer um documentário sobre a vida dele. Foi então que pesquisei, conversei, e tive a real noção do feito. Se hoje é difícil ser atleta, imagina naquela época.

Se alguns o cumprimentavam, os amigos de Diego temiam o sério e disciplinador Adhemar, legado de uma carreira esportiva em alto nível. Ele garante, no entanto, que bastavam cinco minutos de prosa para compartilhar sorrisos com o avô. Nascido em 1927, o paulista do bairro de Casa Verde era ligado à música e chegou a trabalhar como ator. Adhemar tinha facilidade para aprender línguas. Antes de ser adido cultural do Brasil na Nigéria, formou-se em direito, educação física e relações públicas.

Treinado pelo alemão Dietrich Gerner, que o acompanharia por toda a carreira, seu primeiro grande feito nos Jogos foi em Helsinque, ao quebrar um jejum de 32 anos sem medalhas de ouro para o Brasil. A última havia sido conquistada por Guilherme Paraense, na Antuérpia. Adhemar conquistaria o bicampeonato em Melbourne-1956.

Antes disso, em Londres-1948, sua primeira participação nos Jogos havia sido discreta: o oitavo lugar no salto triplo. Em conversa com o nadador brasileiro Tetsuo Okamoto, medalhista de bronze na prova dos 1.500 m livre em Helsinque, quando que foi companheiro de Adhemar, Diego conheceu um pouco mais de seu avô.

— Okamoto me contou que meu avô gelou quando foi para a primeira Olimpíada. Era a primeira vez que ele viajava para fora do Brasil. Não fez nada, foi muito mal — relata. — Quando ele voltou para o Brasil, teve dimensão do que aconteceu em Londres.

Adhemar percebeu que precisava se preparar melhor para a Olimpíada seguinte. Aprendeu até a falar um pouco de finlandês. A tática parece ter dado certo até mais do que o necessário. O paulista bateu quatro vezes o recorde mundial ao conquistar a medalha de ouro.

— Na época, muitos diziam que ele não treinava, que só queria tocar violão. E ele calou a boca dessa pessoas quebrando o recorde mundial — orgulha-se Diego.

O recorde mundial já era de Adhemar desde 1950, quando alcançou a marca de 16 m, dividindo o feito com o japonês Naoto Tajima. No ano seguinte, avançou um centímetro e passou a ser o único dono do recorde, que quebraria diversas vezes em sequência. Em Helsinque, chegou aos 16,22 m.

Saudado pela torcida, que gritava seu nome “Da Silva” no Estádio Olímpico de Helsinque, o brasileiro passou a cumprimentar os torcedores. Assim continuou fazendo até que deu uma volta completa. A partir daquele momento, estaria criada a “volta olímpica”, incorporada pela maioria dos vencedores ao longo dos anos.

Adhemar voltaria aos Jogos para se sagrar bicampeão do salto triplo em Melbourne. Dessa vez, saltando 16,35 m, que, além de suficiente para vencer seus concorrentes, era o recorde olímpico. As duas estrelas que representam o bicampeonato de Adhemar até hoje estão cravadas sobre o escudo do São Paulo, mesmo nos uniformes de futebol, homenagem rara no Brasil.

Em sua terceira olimpíada, Adhemar já não conseguiu repetir o melhor desempenho. Fumante desde a adolescência, tinha contraído uma pneumonia. Se um dia criou a volta olímpica para saudar as arquibancadas, dessa vez viria do público a homenagem para o bicampeão.

— Sem conseguir saltar direito, ele pegou suas coisas e estava deixando o estádio, voltando para a área interna, quando começou a ouvir um barulho. Ele pensou que alguém tivesse quebrado o recorde da prova, mas, quando virou para trás, o Estádio Olímpico de Roma estava batendo palmas para ele — emociona-se Diego.

Jornalista e humorista, Diego dedica sua vida à luta pelo esporte que deu medalhas ao avô. No Instituto Salto para a Vida, atendeu só nos primeiros meses de 2016 mais de cinco mil crianças, que tiveram um primeiro contato com o atletismo. Casado com a velocista Rosemar Coelho Neto, que, em 2008, chegou em 4º com o time brasileiro no revezamento 4 x 100m, Diego teve recentemente uma filha. Se depender da genética...